quarta-feira, 13 de abril de 2011

Campanha #EUSOUGAY - DIVULGANDO

Carol Almeida lançou uma campanha de enfrentamento a intolerância, ao odio e as diversas manifestações da discriminação que permeiam nossa sociedade a partir do indignamento causado pela morte da jovem lésbica Adriele. 

Por considerar sua ação de extrema importância para lançar luz a revisão de posturas, valores, respeito e ao proprio sentido de humanidade na nossa sociedade, replico a campanha para que esta chegue como proposto pela jornalista ao maior numero de pessoas que se possa.

Segue abaixo

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Adriele Camacho de Almeida, 16 anos, foi encontrada morta na pequena cidade de Itarumã, Goiás, no último dia 6. O fazendeiro Cláudio Roberto de Assis, 36 anos, e seus dois filhos, um de 17 e outro de 13 anos, estão detidos e são acusados do assassinato. Segundo o delegado, o crime é de homofobia. Adriele era namorada da filha do fazendeiro que nunca admitiu o relacionamento das duas. E ainda que essa suspeita não se prove verdade, é preciso dizer algo.

Eu conhecia Adriele Camacho de Almeida. E você conhecia também. Porque Adriele somos nós. Assim, com sua morte, morremos um pouco. A menina que aos 16 anos foi, segundo testemunhas, ameaçada de morte e assassinada por namorar uma outra menina, é aquela carta de amor que você teve vergonha de entregar, é o sorriso discreto que veio depois daquele olhar cruzado, é o telefonema que não queríamos desligar. É cada vez mais difícil acreditar, mas tudo indica que Adriele foi vítima de um crime de ódio porque, vulnerável como todos nós, estava amando.

Sem conseguir entender mais nada depois de uma semana de “Bolsonaros”, me perguntei o que era possível ser feito. O que, se Adriele e tantos outros já morreram? Sim, porque estamos falando de um país que acaba de registrar um aumento de mais de 30% em assassinatos de homossexuais, entre gays, lésbicas e travestis.

E me ocorreu que, nessa ideia de que também morremos um pouco quando os nossos se vão, todos, eu, você, pais, filhos e amigos podemos e devemos ser gays. Porque a afirmação de ser gay já deixou de ser uma questão de orientação sexual.

Ser gay é uma questão de posicionamento e atitude diante desse mundo tão miseravelmente cheio de raiva.

Ser gay é ter o seu direito negado. É ser interrompido. Quantos de nós não nos reconhecemos assim?

Quero então compartilhar essa ideia com todos.

Sejamos gays.

Independente de idade, sexo, cor, religião e, sobretudo, independente de orientação sexual, é hora de passar a seguinte mensagem pra fora da janela: #EUSOUGAY

Para que sejamos vistos e ouvidos é simples:

1) Basta que cada um de vocês, sozinhos ou acompanhados da família, namorado, namorada, marido, mulher, amigo, amiga, presidente, presidenta, tirem uma foto com um cartaz, folha, post-it, o que for mais conveniente, com a seguinte mensagem estampada: #EUSOUGAY

2) Enviar essa foto para o mail projetoeusougay@gmail.com

3) E só :-)

Todas essas imagens serão usadas em uma vídeo-montagem será divulgada pelo You Tube e, se tudo der certo, por festivais, fóruns, palestras, mesas-redondas e no monitor de várias pessoas que tomam a todos nós que amamos por seres invisíveis.

A edição desse vídeo será feita pelo Daniel Ribeiro, diretor de curtas que, além de lindos de morrer, são super premiados: Café com Leite e Eu Não Quero Voltar Sozinho.

Quanto à minha pessoa, me chamo Carol Almeida, sou jornalista e espero por um mundo melhor, sempre.


As fotos podem ser enviadas até o dia 1º de maio.

Como diria uma canção de ninar da banda Belle & Sebastian: ”Faça algo bonito enquanto você pode. Não adormeça.” Não vamos adormecer. Vamos acordar. Acordar Adriele.

— Convido a todos os blogueiros de plantão a dar um Ctrl C + Ctrl V neste texto e saírem replicando essa iniciativa —

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Entre mudanças e permanências: reflexões sobre os Kits Educativos do Projeto Escola Sem Homofobia


Taisa Ferreira*

No ultimo período, temos visto repercutir nas mídias diversas informações distorcidas sobre os kits de materiais educativos oriundos do Projeto Escola Sem Homofobia. Muitas fantasias têm sido negativamente construídas através da movimentação de setores ultraconservadores, pautados em ideias religiosas de base fundamentalista contra o material.

Através de críticas infundadas, apelidos depreciativos e teses que nada mais fazem do que macular o real objetivo da iniciativa, as movimentações citadas produzem informações ora confusas, ora desconstrutivas que geram desconforto, fortalecem o preconceito e impulsionam ao mesmo tempo defesas e questionamentos sobre o quão democrática e igualitária nossa sociedade está disposta a ser.

O Kit de materiais educativos ainda está em análise junto ao Ministério da Educação (MEC) para posterior lançamento e distribuição. Com toda essa polêmica, muitas pessoas ainda se perguntam o que é este projeto? Mas o que é este kit? Por que a escola precisaria de um material desse? O que está por trás de tudo isso? Diante da compreensão, de que enquanto educadores, sempre devemos estar atentos e refletindo sobre tudo que diz respeito à educação e vida em sociedade, gostaria de tecer algumas ponderações.


Nas ultimas décadas houveram transformações significativas no modo como o gênero e a sexualidade são pensados e vividos no Brasil. A criação da pílula anticoncepcional, a divulgação dos ideais da contracultura, a emergência da epidemia do HIV- Aids, o surgimento dos movimentos feministas e pelos direitos das pessoas LGBT,s’[1], possibilitaram colocar o gênero e a sexualidade na ordem do dia, na mídia, nas políticas públicas e nas mais diversas áreas de conhecimento.

Porém tratar das relações de gênero, sexualidade e diversidade sexual na sociedade contemporânea, ainda se caracteriza, sobretudo como um grande desafio, pois perpassa por atravessar conflitos em uma sociedade marcada historicamente por valores machistas e por relações de poder que privilegiam a heterossexualidade em detrimento de outras orientações sexuais (heteronormatividade), valores estes que ainda hoje são proliferados, renegando a multiplicidade de culturas, etnias, religiões e orientações sexuais existentes, fazendo germinar preconceitos e ações discriminatórias em relação às diversidades.

A estrutura social, econômica e jurídica que vivenciamos nega direitos fundamentais, limitando o pleno exercício da dignidade da pessoa humana e da cidadania, ao cercear a plena capacidade civil a mulheres, gays, lésbicas, bissexuais, transexuais, travestis, negras (os) e indígenas, entre outros grupos historicamente invisibilizados. Tal dinâmica têm produzido maneiras enrijecidas de enxergar o mundo, o que na maioria das vezes acarreta a cristalização das posições dos sujeitos, bem como a criação de estereótipos, constituindo-se em latente desigualdade social.

Louro (1999) afirma que:

A escola é uma entre as múltiplas instâncias sociais que exercitam uma pedagogia da sexualidade e do gênero, colocando em ação várias tecnologias de governo. Esses processos prosseguem e se completam através de tecnologias de autodisciplinamento e autogoverno exercidas pelos sujeitos sobre si próprios, havendo um investimento continuado e produtivo desses sujeitos na determinação de suas formas de ser ou "jeitos de viver" sua sexualidade e seu gênero. (p. 25)

Quando discussões sobre sexualidade ocorrem no espaço escolar em geral são priorizadas questões referentes à reprodução humana, fazendo assim com que as questões ligadas à sexualidade se limitem à procriação, desvinculando e até ignorando as questões do desejo, e das múltiplas possibilidades de vivência da sexualidade

Em contraposição a esse cenário, as perspectivas atuais de reflexão acerca dos currículos e das práticas escolares, postuladas a partir da LDB n. 9394/96, do Referencial Curricular Nacional, dos Parâmetros Curriculares Nacionais, das propostas e acordos oriundos das Conferências Nacionais, assinalam uma preocupação em relação ao respeito à diversidade e propõe uma leitura crítica da realidade, em que sugere a escuta e produção das identidades dos grupos até o momento silenciados pela dinâmica da sociedade e neste sentido que se justificam ações como o Projeto Escola Sem Homofobia.


O que é este projeto?

É  resultado de um esforço de diversas entidades e do governo federal para combater o preconceito, a discriminação e a invisibilização direcionada as pessoas LGBT's no âmbito escolar, e se constitui como uma das ações previstas no Programa Brasil sem Homofobia, o qual tem entre seus objetivos promover a cidadania de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais, a partir da equiparação de direitos e do combate à violência e à discriminação homofóbicas, respeitando a especificidade de cada um desses grupos.

O Projeto Escola sem Homofobia (ESH) foi apoiado pelo Ministério da Educação (MEC), contou com a orientação técnica da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (SECAD) do Ministério da Educação e foi impulsionado pela Frente Parlamentar pela Cidadania LGBT, por meio de recursos aprovados pela Emenda Parlamentar da Comissão de Legislação Participativa.

Configura-se como uma ação colaborativa de organizações da sociedade civil (rede internacional Global Alliance for LGBT Education – GALE; a organização não governamental Pathfinder do Brasil; a ECOS – Comunicação em Sexualidade; a Reprolatina – Soluções Inovadoras em Saúde Sexual e Reprodutiva; e a ABGLT – Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais) sendo pensado e executado pelas mesmas sob acompanhamento do MEC e da SECAD.

O projeto teve em seu bojo a realização de seminários por região do país para construir um perfil da homofobia com participação de profissionais da educação, gestores e sociedade civil, a realização de uma pesquisa sobre a homofobia no ambiente escolar em onze capitais brasileiras, a produção de materiais educacionais abordando o tema da homofobia, lesbofobia e transfobia e a capacitação de técnicos da educação e pessoas do movimento LGBT voltada para instrumentalização acerca do trabalho a ser desenvolvido com o kit.


Mas o que é este Kit?

Segundo nota oficial emitida pelas entidades responsáveis pelo projeto, o kit corresponde a um material composto por um caderno; uma série de seis boletins (Boleshs); três audiovisuais com seus respectivos guias; um cartaz; cartas de apresentação para o/a gestor(a) e para o/a educador(a), destinado à formação dos/das professores(as) em geral, com intuito de dar subsídios para que estes trabalhem os temas no ensino médio. Trata-se de um conjunto de instrumentos didático-pedagógicos que visam à desconstrução de imagens estereotipadas sobre lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais e para o convívio democrático com a diferença, contribuindo para:

• Alterar concepções didáticas, pedagógicas e curriculares, rotinas escolares e formas de convívio social que funcionam para manter dispositivos pedagógicos de gênero e sexualidade que alimentam a homofobia.

• Promover reflexões, interpretações, análises e críticas acerca de algumas noções que freqüentemente habitam as escolas com tal “naturalidade” ou que se naturalizam de tal modo que se tornam quase imperceptíveis, no que se refere não apenas aos conteúdos disciplinares como às interações cotidianas que ocorrem nessa instituição.

• Desenvolver a criticidade infanto-juvenil relativamente a posturas e atos que transgridam o artigo V do Estatuto da Criança e do Adolescente, segundo o qual: “Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais”.

• Divulgar e estimular o respeito aos direitos humanos e às leis contra a discriminação em seus diversos âmbitos.

• Cumprir as diretrizes do MEC; da SECAD; do Programa Brasil sem Homofobia; da Agenda Afirmativa para Gays e outros HSH e Agenda Afirmativa para Travestis do Plano Nacional de Enfrentamento da Epidemia de AIDS e das DST entre Gays, HSH e Travestis; dos Parâmetros Curriculares Nacionais; do Plano Nacional de Promoção da Cidadania e Direitos Humanos de LGBT; do Programa Nacional de Direitos Humanos III; das deliberações da 1ª Conferência Nacional de Educação; do Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos; e outras. [2]


No meu entendimento além dos pontos elencados, acima de tudo este material pode ser uma oportunidade para a escola e os profissionais da educação a partir de instrumentos qualificados construirem ações concretas voltadas a superação da idéia de homogeneidade, relações desiguais, e dos paradigmas que foram ao longo dos anos desenvolvidos na nossa sociedade no que diz respeito às relações de gênero, à diversidade, a sexualidade, na vida social e nos espaços de poder, se constitui como uma possibilidade de fomentar o desenvolvimento humanístico, voltado para uma consciência critica e reflexiva do individuo. Bem como oportuniza os (as) educadores (as) a repensarem o papel que tem cumprido nas suas práticas educativas.


Por que a escola precisaria de um material desse?


A instituição escolar tem um papel fundamental de proporcionar ao indivíduo um ambiente favorável para a aprendizagem de modo que aconteça o desenvolvimento desse sujeito, mediante ações significativas, que contribuam para enriquecer o seu conhecimento e potencialize o seu crescimento pessoal. Assim, para que esse processo de construção aconteça, a escola necessita ter uma atuação planejada e intencional para orientar e guiar a aprendizagem do educando, bem como ter clareza de seu papel social frente às diversidades da cultura humana.

Segundo Martins (2001) como conseqüência de uma cultura com concepções bastante rigorosas no que diz respeito à questão de gênero e sexualidade, a escola enfrenta grande dificuldade para lidar com questões de ordem sexual. E apesar de alguns educadores possuírem variados graus de formação e informação muitas vezes se omitem ou se permitem silenciar, desta forma a escola acaba por oferecer pouca oportunidade para reflexão sobre as questões que envolvem a diversidade sexual.

A discussão acerca da sexualidade no meio escolar assim como na sociedade em geral, ainda é permeada de tabu. Em geral, as pedagogias da sexualidade e do gênero são usadas para ponderar o que é ou não natural, como devem ser exercidas as identidades de gênero e sexual, em função de uma noção heteronormativa do ser humano. Em casos em que a sexualidade é tratada em sala de aula, esta discussão ocorre através de aulas de ciências ou biologia, ou ainda como aponta Fraga (2000) citado por Lima (2006):

Ao se tomar como ponto de análise a forma como os currículos escolares estão estruturados, é possível perceber que as questões relativas à sexualidade não aparecem de maneira explícita. Quando o tema precisa ser tratado, geralmente a instituição educativa recorre aos especialistas da área médica e/ou psicológica, organizando palestras ou oficinas. (p.64)

De acordo com a nota oficial das entidades responsáveis pelo projeto, os resultados da pesquisa desenvolvida pelo Projeto Escola Sem Homofobia mostraram que:


“(...) existe homofobia na escola e houve consenso de que as atitudes e práticas de discriminação e violência trazem consequências sérias para os e as estudantes, que vão desde tristeza, depressão, baixa na autoestima, queda no rendimento escolar, evasão escolar e até casos de suicídio foram relatados. A pesquisa também mostrou que embora exista uma política de educação sexual, na opinião de estudantes e de educadores, não há educação sexual de maneira sistemática na escola e não se abordam as diversidades sexuais. Entre os motivos apontados está a falta compreensão sobre a homossexualidade, a falta de preparo de educadores/as sobre o tema sexualidade e diversidades sexuais, o preconceito que existe na escola sobre o tema, o temor da reação das famílias e a falta de materiais para trabalhar o tema. (...) As recomendações feitas incluíram realizar cursos de capacitação para educadores/as sobre o tema e disponibilizar nas escolas materiais que permitam acabar com a homofobia na escola.”


Dados da UNESCO, citados por Abromovay (2004) comprovam que a intolerância e a falta de conhecimento sobre a diversidade de expressão sexual colocam a escola entre os órgãos que merecem atenção sobre a questão, notadamente quando o preconceito parte dos professores e professoras.

A pesquisa “Perfil dos Professores Brasileiros”, realizada pela UNESCO, em todas as unidades da federação brasileira, revelou que para 59,7% dos professores (as) é inadmissível que uma pessoa tenha relações homossexuais e que 21,2% deles tampouco gostariam de ter vizinhos homossexuais. Outra pesquisa, realizada pelo mesmo organismo em 13 capitais brasileiras e no Distrito Federal, forneceu certo aprofundamento na compreensão do alcance da homofobia no ensino básico (fundamental e médio). Constatou-se, por exemplo, que o percentual de professores (as) que declara não saber como abordar os temas relativos à homossexualidade em sala de aula pode chegar a 48%. O percentual de mestres(as) que acreditam ser a homossexualidade uma doença ultrapassa os 20% em muitas capitais”. (Abramovay, 2004)

A pesquisa Política, direitos, violência e homossexualidade: realizada na Parada Gay do Rio de Janeiro de 2004, revelou que a escola é o terceiro ambiente onde os respondentes sofrem discriminação (26,5%) e agressão (10%). A investigação foi realizada pelo Centro Latino-Americano em Sexualidade e Direitos Humanos (Clam), em conjunto com o Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (Cesec) e a Organização Não-Governamental Grupo Arco-Íris (GAI).

Diversas outras pesquisas desenvolvidas nos últimos dez anos tem assinalado a existência do preconceito, discriminação e invisibilização das e dos LGBT”s na escola, questionando o papel desta e de seus profissionais no que diz respeito a práticas voltadas para emancipação dos sujeitos, entre estas citam-se: o estudo "Revelando Tramas, Descobrindo Segredos: Violência e Convivência nas Escolas", publicado em 2009 pela Rede de Informação Tecnológica Latino-Americana, a pesquisa “Preconceito e Discriminação no Ambiente Escolar” realizada pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas, e também publicada em 2009, a pesquisa “Diversidade Sexual e Homofobia no Brasil: intolerância e respeito às diferenças sexuais publicada em 2009, pela Fundação Perseu Abramo, além dos diversos estudos feitos nos meios acadêmicos e das diversas bibliografias sobre o tema.

Esse cenário alerta para o papel da Educação no combate à homofobia, lesbofobia, bifobia e transfobia, por meio de ações que promovam a construção de uma sociedade justa e equânime e que garantam os direitos humanos, por intermédio da integração das políticas públicas citadas aos Parâmetros Curriculares Nacionais (1997) para a Orientação Sexual, bem como nas propostas oriundas tanto da Conferência Nacional de Educação (2010) quanto da Conferência Nacional GLBT (2008).

A escola ainda reflete o panorama de desconhecimento dessas políticas no que diz respeito a ações práticas, o que dificulta o reconhecimento da homofobia presente no cotidiano e ressalta o despreparo de educadores para lidar com essa situação. E apontam a necessidade de se compreender a diversidade como base da estrutura social e entender que toda a intervenção curricular/ pedagógica tem como finalidade além da produção de conhecimentos, o preparo de cidadãos (ãs) capazes de exercitar socialmente, criticamente e solidariamente as suas ações, assim a discussão sobre identidades de gênero, sexualidade e diversidade sexual na escola representa uma possibilidade de romper com o processo de homogeneização da humanidade, onde a idéia de evolução e o acúmulo de conhecimentos seria um processo universal e natural das coisas.


O que está por trás de tudo isso?


Como dito no começo desta conversa um movimento ultraconservador e de cunho religioso de base fundamentalista tem se organizado e proferido discursos nas redes sociais, nos templos religiosos e até mesmo na Câmara e no Senado no sentido de desconstruir a iniciativa inscrita no bojo do Projeto Escola Sem Homofobia, agregando informações carregadas de inverdades, desconhecimento, logrando em suas teses o lugar de perigo aos dissidentes das normais sociais de gênero e sexualidade e principalmente fomentando a negação do direito a cidadania plena das pessoas LGBT’s.

O maior opositor do projeto atualmente é o deputado federal Jair Bolsonaro(PP-RJ). Entre os discursos proferidos pelo parlamentar está a defesa em “dar um couro” para “corrigir” um filho “meio gayzinho, em que a violência contra as pessoas LGBT é estimulada, bem como o argumento de que o governo poderia gastar melhor a verba pública em outros projetos, ignorando a importância de combate ao preconceito em um país em que apesar da diversidade de sua composição, a desigualdade e discriminação adquire muitos rostos, caracterizando-se muitas vezes como um local imerso numa cultura da discriminação, na qual relação com as diferenças são manifestadas pelo não reconhecimento dos se considera não somente diferentes, mas, em muitos casos, “inferiores”, por diferentes características identitárias e comportamentos.


Esses breves exemplos e tantos outros de podem ser identificados em uma rápida pesquisa na internet nos apontam que por trás destas posturas vemos a disseminação do ódio, do preconceito e da discriminação. Através de argumentos torpes e hostis, está tão somente a negação da essência humana das pessoas LGBT e a negação de seus direitos enquanto cidadãos, por trás desses discursos e movimentações que negam a escola enquanto lócus possível de trabalhar o respeito as diferenças está a proliferação da idéia de inferioridade das pessoas LGBT, contrariando a própria Constituição que sinaliza que todos somos iguais.


Da parte das organizações do movimento social LGBT, dos estudiosos que combatem o preconceito e discriminação contra pessoas LGBT’s, dos formuladores de políticas públicas e que são sensíveis aos sofrimentos e a lutam contra a opressão causados a essa parcela da população, das instituições e entidades nacionais e internacionais que apoiam o combate a toda forma de discriminação as e os LGBT’s, a movimentação tem sido no sentido de seguir fazendo o enfrentamento a toda forma de opressão, lutar pela garantia de direitos que historicamente têm sido negados, buscar construir junto a sociedade novas bases de valores que desemboquem em uma sociedade que valorize a equidade entre os sujeitos que a compõe, fazer as vozes por tanto tempo silenciadas serem ouvidas.

Aos (as) profissionais da educação e a escola, cabe a reflexão sobre seu papel frente à superação das discriminações e a desnaturalização das desigualdades, que perpassa pela construção de uma ética fundada no respeito e na cidadania, condição básica para a convivência em grupo. Cabe a assunção da postura política de se apropriar de todo e qualquer instrumento que possa contribuir com sua prática no sentido de contribuir para desconstrução das relações desiguais que são desenvolvidas na escola e na sociedade.

Dinis e Cavalcanti (2008) sinalizam que:

O desafio está em uma nova educação que questione os aspectos heteronormativos presentes na formação de nossas identidades sexuais e de gênero, ajudando os/as educandos/educandas a descobrir o campo dos limites e das possibilidades impostas a cada pessoa quando se submete aos estereótipos que são atribuídos a uma identidade fixa sexual e de gênero. É importante aprender que não existe uma verdade única e universal sobre a sexualidade, o que exige revermos os mecanismos de saber-poder que constituem a própria sexualidade, muitas vezes através de perspectivas biologizantes e essencialistas. Compor uma nova ética na educação que nos possibilite reinventar novas relações com nossos corpos, com nossos prazeres e com as outras pessoas. Ser afetado pelas inúmeras possibilidades de ser e existir no mundo, para além de verdades absolutas, tentando fazer da vida um eterno processo de criação da diferença. (p.108)

O que está por trás do Kit de Materiais Educativos do Projeto Escola sem Homofobia é, portanto um posicionamento contra processos de colonização e dominação, é a luta constante pela delimitação de um princípio radical da educação pública e democrática: a escola pública se tornará cada vez mais pública na medida em que compreender o direito à diversidade e o respeito às diferenças como um dos eixos norteadores da sua ação e das práticas pedagógicas.


REFERÊNCIAS

ABRAMOVAY, M. Juventudes e sexualidade./ Miriam Abramovay, Mary Garcia Castro e Lorena Bernadete da Silva. Brasília: UNESCO Brasil, 2004.


DINIS, Nilson Fernandes; CAVALCANTI, Roberta Ferreira. Discursos sobre homossexualidade e gênero na formação em pedagogia. Pro-Posições, Campinas, v. 19, n. 2, ago. 2008. Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-73072008000200008&lng=pt&nrm=iso


LIMA, Francis Madlener de. O discurso sobre a homossexualidade no universo escolar: um estudo no curso de licenciatura em educação física. (2006) Disponível em:http://dspace.c3sl.ufpr.br/dspace/bitstream/1884/7607/1/Lima.Francis_Dissertacao.pdf

LOURO, Guacira L. Gênero sexualidade e educação: uma perspectiva pós-estruturalista. Petrópolis: Vozes, 1999

MARTINS, Vicente. A homossexualidade no meio escolar. (2001) Disponível em: www.psicopedagogia.com.br/artigos


Informações sobre Projeto ESH – www.ecos.org.br/projetos/esh.asp

Informações sobre organismos que emitiram apoio ao Kit e ao Projeto –


NOTAS
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[1] Sigla re-definida na I Conferência Nacional GLBT (Gays, Lésbicas, Bissexuais e Transgêneros) (2008) para designar Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgêneros.

[2] Trechos retirados da Nota Oficial sobre Projeto Escola sem Homofobia emitida pelas entidades organizadoras.


• Taisa Ferreira é Pedagoga, Militante do Coletivo Estopim e do Coletivo Kiu, Ativista da Associação Beco das Cores e Membro Titular no Comitê Estadual LGBT/BA - taysynha18@yahoo.com.br

sábado, 12 de março de 2011

ABGLT lança Manisfesto chamando a II Marcha Nacional Contra a Homofobia

Fonte: Lista das Afiliadas da ABGLT


Manisfesto a II Marcha Nacional Contra a Homofobia
“Nada é mais forte que uma ideia cujo tempo chegou”. Vitor Hugo

Igualdade de direitos. Fim da discriminação. Fim da violência. Cidadania plena. Reconhecimento. Respeito. Essas são as nossas reivindicações. Somos milhões de brasileiras e brasileiros, ainda excluídos da democracia e ignorado pelas leis do país.

Somos lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais (LGBT), de todos os cantos do país, de todas as profissões, de todos credos, de todas raças, de todos sotaques, de todas opiniões, de todas etnias, de todos gostos e culturas. Mas temos algo em comum. Não usufruímos nossos direitos pelo simples fato de termos uma orientação sexual ou identidade de gênero diferente da maioria. Somos milhões de cidadãos /ãs de “segunda classe “ em nosso Brasil.

Faz 22 anos que o Brasil se democratizou e promulgou a “Constituição Cidadã”. Entretanto, em todo esse período, nossa jovem democracia não foi capaz de incorporar a população LGBT. Até hoje não existe sequer uma lei que assegure nossos direitos civis. Não existem leis que nos protejam da violência homofóbica.

A homofobia não é um problema que afeta apenas a população LGBT. Ela diz respeito também ao tipo de sociedade que queremos construir. O Brasil só será um país democrático de fato se incorporar todas as pessoas à cidadania plena, sem nenhum tipo de discriminação. O reconhecimento e o respeito à diversidade e à pluralidade constituem um fundamento da democracia. Enquanto nosso país continuar negando direitos e discriminando lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais não teremos construído uma democracia digna desse nome.

Por essa razão é que a Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais - ABGLT, convoca e coordenará todos os/as ativistas de suas 237 ONGs afiliadas e pessoas e organizações aliadas à II Marcha Nacional contra a Homofobia, a ser realizada na cidade de Brasília , em 18 de maio de 2011, com concentração às 9h, na Esplanada dos Ministérios, em frente à Catedral Metropolitana.

O dia 17 de maio é comemorado como o dia internacional contra a homofobia (ódio, agressão, violência, discriminação e até morte de LGBT). A data marca uma vitória histórica do Movimento LGBT internacional. Foi quando a Organização Mundial de Saúde retirou a homossexualidade do Código Internacional de Doenças.

Vamos a Brasília, novamente, para denunciar a homofobia, o racismo, o machismo e a desigualdade social. Temos assistido nos últimos meses ao recrudescimento da violência homofóbica, a exemplo do que ocorreu recentemente em São Paulo, no Rio de Janeiro, no Ceará, no Paraná e em Minas Gerais. Chama a atenção o fato de que muitos dos agressores não pertencem a grupos de extrema-direita violentos, mas são jovens de classe média, o que demonstra como a homofobia está amplamente difundida em toda sociedade.

O Brasil está mudando. Elegemos um operário e agora uma mulher presidenta da República, que coloca como meta central de seu governo a erradicação da extrema pobreza. A sociedade brasileira não é contra o reconhecimento dos direitos LGBT. A grande oposição à cidadania LGBT vem dos fundamentalistas religiosos. Algumas denominações evangélicas e parte da igreja católica dedicam esforços imensos a atacar permanentemente a comunidade LGBT e bloquear qualquer ação que garanta direitos a essa população.

O Brasil é um país plural e diverso, que respeita todas os credos e religiões, contudo nosso Estado é laico – separamos a religião da esfera pública, isso está garantido constitucionalmente. O movimento LGBT defende a mais ampla liberdade religiosa. Respeitamos todos os credos e opiniões, mas, entendemos que crenças religiosas pertencem à esfera privada - individual ou comunitária. Religião é uma escolha, a cidadania não!

Não aceitamos que dogmas religiosos sejam usados como justificativas para o preconceito e negação de direitos aos LGBT. É preciso assegurar a laicidade do Estado e garantir o respeito à diversidade.

A II Marcha Nacional ontra a Homofobia é, portanto, um grito, um protesto, um manifesto de respeito aos direitos individuais e coletivos.

Queremos igualdade de direitos e políticas públicas de combate à homofobia. Reivindicamos que o Estado brasileiro, de conjunto (ou seja, os três poderes), e em todas as esferas da federação (União, Estado e municípios) incorporem a diretriz de combater a homofobia e promover a cidadania plena para a população LGBT.

Defendemos que:
- o Estado laico seja assegurado, sem interferência dos fundamentalismos religiosos;

- o Governo Federal acelere a implementação do Plano Nacional de Promoção dos Direitos Humanos e Cidadania de LGBT, garantindo recursos orçamentários e o necessário controle social e accountability na sua execução, promovendo a diminuição da homofobia;

- todos governos estaduais e municipais instituam : coordenadorias LGBT, Conselhos LGBT e Planos de Combate à Homofobia;

- o Congresso Nacional aprove a criminalização da homofobia (PLC 122), a união estável e o casamento civil; a alteração do prenome das pessoas transexuais, o reconhecimento do nome social das travestis;

- o Judiciário, em todos os níveis, faça valer a igualdade plena entre todas as pessoas, independente de sua orientação sexual e/ou identidade de gênero;

- o Superior Tribunal de Justiça reconheça como entidades familiares as uniões entre pessoas do mesmo sexo;
- o Supremo Tribunal Federal julgue favoravelmente às Ações que pleiteiam a união estável entre pessoas do mesmo sexo e o direito das pessoas transexuais alterarem seu prenome.


Na ocasião da II Marcha, convidamos a todas e todas para participar do VIII Seminário LGBT no Congresso Nacional, a ser realizado no dia 17 de maio – Dia Internacional Contra a Homofobia – no auditório Nereu Ramos.



Março de 2011

ABGLT – Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais

sexta-feira, 11 de março de 2011

8 de março

Fonte: oestopimba.blogspot.com


por Taisa Ferreira*


A sociedade ocidental é historicamente marcada pela intensa produção e reprodução de hierarquias e desigualdades pautadas nas diferenças de gênero. Assim, neste breve ensaio de escrita, nesta data (08/03) duplamente simbólica: comemoração do dia internacional das mulheres e meu aniversário - gostaria de dialogar sobre a construção social das diferenças de gênero, a posição das mulheres na sociedade ao longo dos anos no enfrentamento às desigualdades centradas nestas diferenças.


Desde o surgimento das sociedades humanas, houve a definição de papéis para os homens e para as mulheres e a divisão do trabalho foi articulada baseada no fator sexual, marcada desde sempre pela capacidade reprodutora da mulher, o fato de gerar o filho e de amamentá-lo. Na fase pré-capitalista, todos trabalhavam numa mesma unidade econômica de produção e o modelo de família era multigeracional. Segundo Adriana Bessa em seu texto O papel da mulher na sociedade, o mundo do trabalho e o mundo doméstico eram coincidentes. A função de reprodutora da espécie, que cabe à mulher, favoreceu a sua subordinação ao homem. E esta foi sendo considerada mais frágil e incapaz de assumir a direção e chefia do grupo familiar. O homem, associado à idéia de autoridade devido a sua força física e poder de mando, assumiu o poder dentro da sociedade. Assim, surgiram as sociedades patriarcais.


Com o “grande advento” das sociedades fundadas no poder masculino, a sexualidade da mulher submeteu-se cada vez mais aos interesses do homem, tanto no repasse dos bens materiais, através da herança, como na reprodução da sua linhagem. A mulher passou a ser do homem, devendo ser submissa a este.

 
Nesse sentido trago um olhar sobre a concepção de gênero como um elemento que em nossa sociedade é demarcador das relações de poder entre masculino e feminino.


A cultura reproduz tradições que sustentam as diferenças, as desigualdades e a determinação dos papeis sociais de homem e mulher se produzem e reproduzem nos mais distintos espaços sociais, construindo limites ao que cabe a cada um na atuação frente ao meio social. Sabemos que toda e qualquer desigualdade é construída culturalmente, a partir das expectativas que a sociedade institui para os sujeitos, todavia é também neste espaço de disputa de poder, de discriminações, opressões, em que a mulher corriqueiramente é inferiorizada, que a sua luta se fortalece.

 
Assim, com o desenvolvimento das sociedades industriais, a mulher das camadas populares foi submetida ao trabalho fabril. No século XVIII e XIX o abandono do lar pelas mães que trabalhavam nas fábricas levou a sérias conseqüências para a vida das crianças. A desestruturação dos laços familiares, das camadas trabalhadoras e os vícios decorrentes do ambiente de trabalho fez crescer os conflitos sociais. A revolução industrial incorporou o trabalho da mulher no mundo da fábrica, separou o trabalho doméstico do trabalho remunerado fora do lar. Eis que surge a instauração da desigualdade de condições no mundo do trabalho, haja vista que a mulher foi incorporada subalternamente ao trabalho fabril. Assim, nasceu a luta das mulheres por melhores condições de trabalho.


Ao longo da história, a sociedade nomeou (e ainda nomeia) corpos dotados e os não-dotados de poderes que são vividos, produzidos e legitimados como "naturais". Portanto somos uma sociedade dicotomizada, sendo aos homens sempre concedido uma posição de privilégios em relação à mulher, e muitas vezes as suas diferenças biológicas serviu de base para naturalização das desigualdades.


O discurso científico foi utilizado por muito tempo para lograr reforço as diferenças pautadas nas diferenças de gênero. Retomando a história da construção social do sexo veremos que até o séc. XVIII acreditava-se em sexo único e que o feminino era “imperfeito”, pois não recebera a quantidade necessária de calor vital para seu desenvolvimento completo. O que já remete ao preconceito e inferioridade da mulher.


Toda essa teoria se baseia na ciência e no estudo dos animais, já que os jacarés têm seu sexo definido pelo calor recebido. Charles Darwin dizia que o indivíduo melhor adaptado ao meio era o mais apto a perpetuar sua espécie. A própria medicina também apontava diferenças nos esqueletos masculinos e femininos e atribuía características peculiares a cada gênero. Em função de discursos como estes, as mulheres de um modo geral ainda hoje são vistas como: frágeis, meigas, consumidoras histéricas e, sobretudo: mãe! Já os homens são fortes, desbravadores, consumidores de carros ou algo que potencializa sua força, firmes, decididos e pai como reprodutor "garanhão".

Bila Sorj, estudiosa do campo do Gênero nos afirma que:

Gênero significa então que homens e mulheres são produtos da realidade social e não decorrência da anatomia de seus corpos.

O gênero é produzido e reproduzido dentro de processos de diferença e está presente em todos os níveis sociais, sejam eles, escola, religião, mercado de trabalho, política, entre outros. A socialização de gênero, que está associado à abordagem individualista, enfatiza a polarização de gênero, ou seja, a separação/fronteiras entre homens e mulheres e seus papéis na sociedade. Há uma imposição onde tudo aquilo que está associado ao homem é superior ou o que é adequado para um gênero não é para o outro.


Não é por acaso que as posições de homens e mulheres no mercado de trabalho refletem a existência de desigualdades, onde, por exemplo, postos de direção e gerência em grande parte são ocupados por homens e as diferenças salariais são bastante significativas entre homens e mulheres. E sabemos que esta divisão de tarefas acompanha a humanidade desde a sua origem, mas felizmente tem sido contestada vigorosamente nas últimas décadas.


Já no século XIX temos noticia de movimento de mulheres reivindicando direitos trabalhistas, igualdade de jornada de trabalho para homens e mulheres e o direito de voto. Com sua incorporação ao mundo do trabalho fabril a mulher passou a ter uma dupla jornada de trabalho. A ela cabia cuidar dos (as) filhos (as), dos afazeres domésticos e também do trabalho remunerado (situação ainda não muito diferente de hoje). As mulheres pobres sempre trabalharam. A remuneração do trabalho da mulher sempre foi inferior ao do homem. A dificuldade de cuidar dos (as) filhos (as) levou as mulheres a reivindicarem mais escolas, creches e pelo direito da maternidade.

 
Ao retomarmos a história perceberemos que desde muito tempo as mulheres buscam superar a situação de desigualdade que lhe foi imposta. No século XX as mulheres começaram uma luta organizada em defesa de seus direitos. A luta das mulheres contra todas as formas de opressão a que eram submetidas foi denominada de feminismo e a organização das mulheres em prol de melhorias na infra-estrutura social foi conhecida como movimento de mulheres.

 
Citando alguns exemplos de lutas das mulheres no século XX, podemos enumerar dessa forma: as mulheres que lutavam pelo acesso a educação e o direito ao exercício da intelectualidade, visto que estes eram negados ou utilizados no sentido de reforçar a submissão ou uso da mulher apenas como um adorno do marido; podemos resgatar as mulheres no processo de luta na Revolução de 1917 (a Rússia foi o primeiro ais a instituir o direito ao divórcio e ao sufrágio feminino universal); as mulheres que lutaram por direitos trabalhistas justos, dando origem ao nosso 08 de março; podemos resgatar ainda as sufragistas, que pautavam o direito de votar e serem votadas, o direito de exercer sua cidadania, a qual era restrita antes, passando pelo questionamento da assimetria de gênero, o papel que a mulher exercia na sociedade, ao confinamento na esfera doméstica.


Outro fator foi aparecimento da pílula anticoncepcional que permitiu a mulher um maior exercício de autonomia sobre seu corpo, sobre o sexo e a possibilidade de escolher e planejar o melhor momento para maternidade ou mesmo a não maternidade. As mulheres começaram a se organizar sob viés de defesas em que sinalizaram: somos diferentes, mas não desiguais. Atualmente um dos pontos de luta em que as mulheres tem se engajado é o combate a já citada, violência doméstica, a qual mesmo com a criação da Lei Maria da Penha, das delegacias especializadas, infelizmente ainda é muito comum. Paralelamente isso existe a pauta pelo pleno exercício dos direitos sexuais e reprodutivos, democratização da vivência da sexualidade e luta pela descriminalização ou legalização do aborto, bem como luta pela ampliação da participação das mulheres na vida política, a qual em nosso país ainda tem sido cercada de hierarquizações, preconceitos e discriminações.


Há um grande avanço da conquista social da mulher no que diz respeito aos direitos, todavia, há muito a ser mudado. Por exemplo: a mulher vem conquistando gradativamente seu espaço no mercado de trabalho, seu espaço no meio acadêmico, na política (afinal já temos até uma mulher na presidência), mas, e os afazeres domésticos, e a educação dos filhos e a equidade salarial e de oportunidades, e o surto cada vez maior de violência contra mulher que assola este país?

Apesar da existência de políticas públicas de saúde, educação, trabalho e renda específicas para mulher aos poucos estarem sendo construídas no sentido de garantir igualdade entre mulheres e homens, ainda assistimos cenas de barbárie onde a mulher é apenas uma mercadoria humana – sendo vendida, acorrentada, castigada e morta – assemelhando-se ao tratamento dado aos escravos na era do colonialismo.


Cabe ressaltar ainda que ao longo dos anos de enfrentamento a sua posição na sociedade a heterogeneidade que compõe as mulheres logrou também heterogeneidade nas bandeiras de luta, haja vista as lutas das mulheres negras, das mulheres lésbicas e das mulheres transexuais, das mulheres indígenas e camponesas, que trazem a tona singularidades na assunção de suas vozes.


Todavia cabe nesse cenário que se apresenta no século XXI, é preciso que o aporte emancipatório seja expandido e que cada vez mais as mulheres, jovens, meninas ou adultas vivenciem a independência feminina e a conquistemos verdadeiramente com equidade de direitos e oportunidades, fazendo com que essas conquistas cheguem a toda a mulher independente da posição financeira ou acadêmica. É essencial que cada mulher tenha construída em si a consciência sobre seu papel.


Direito ao voto, direito a educação, direito a se manifestar publicamente, direito de ir e vir, direito sobre seu corpo e sexualidade. A mulher deixou de ser tutelada e vem logrando sua emancipação rompendo as barreiras do machismo, do sexismo, lutando por contra toda forma de dominação ao seu exercício de cidadania. Claramente essas mudanças transformaram e transformam o cotidiano e comportamento de toda sociedade partindo do pressuposto de que toda mudança cultural reflete na mudança de atitudes.


Como disse lá no comecinho dessa conversa, é no cotidiano da casa, do bairro, da escola, da escola, da empresa, das cidades, que estão materializados os efeitos da dominação, da exploração e da injustiça social. E aí onde a desigualdade se reproduz como parte da existência humana, mas é aí também que os movimentos de lutas cotidianas, quase sempre invisíveis, tomam forma como parte dessa existência. A luta feminina é uma constante busca pela construção de novas bases de valores sociais e culturais, é uma luta pela verdadeira democracia, a qual deve centrar-se na equidade entre homens e mulheres fazendo avançar para a igualdade entre todos os seres humanos, suprimindo as desigualdades de classes.

Finalizo essa breve escrita, saudando a todas nós mulheres pela sempre presente força na luta por espaços equitativos. Parabenizando pelo 8 de março e lembrando que todos os dias são passiveis de serem 8 de março, uma vez que a luta é continua e cotidiana. Aproveito ainda para convidar todos os homens a se somarem a esta luta no sentido de ressignificar conjuntamente o sentido da vida em sociedade.









* Taisa é Militante do Estopim!, pedagoga e especializanda em Gênero e Sexualidade pela UERJ.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Não quero voltar sozinho

Pesquisa afirma: Transexualismo não está associado a personalidade psicótica

FONTE: http://www1.folha.uol.com.br/equilibrioesaude/874278-transexualismo-nao-esta-associado-a-personalidade-psicotica.shtml



A participação de uma transexual em um dos programas de maior audiência da televisão brasileira --a cabeleireira Ariadna Arantes no Big Brother Brasil, da Rede Globo--, reascendeu a discussão sobre a condição.


Um estudo apresentado no Instituto de Psicologia da USP aponta que o transexualismo não está associado à personalidade psicótica, em contraposição à teoria lacaniana desenvolvida nos anos 1950. De acordo com a teoria, psicanalistas acreditavam que a perda da noção da realidade do corpo faria com que um homem se enxergasse mulher e vice-versa.


Segundo o estudo "Transexualismo, psicanálise e gênero: do patológico ao singular", a vontade de ser do sexo oposto não implica necessariamente uma patologia ou uma disfunção de percepção da aparência, mas uma singularidade de algumas pessoas.


O autor da pesquisa, o psicólogo Rafael Cossi, trabalhou com diversas noções da psicanálise lacaniana para tentar explicar por que algumas pessoas buscam viver suas vidas como se fossem do sexo oposto.


Ele baseou o estudo em seis biografias de transexuais e trabalhou quatro conceitos que estão vinculados ao funcionamento comum da mente humana e não se relacionam com a noção da rejeição: estágio do espelho; o verleugnung (do alemão, "renegação" ou "desmentido"); o semblante; e o sinthoma.


O estágio do espelho está relacionado à formação inicial do ego da pessoa. No caso de transexuais, há momentos, no início da vida, em que a criança percebe que o tratamento que ela recebe do outro não é, sob o seu ponto de vista, coerente com o seu sexo.


"Às vezes, há hesitações por parte do outro, não confirmando para a criança que ela pertence ao sexo que o seu corpo indica", explica o psicólogo.


A noção de verleugnung implica negar a presença de algo, mesmo reconhecendo sua existência. "O transexual não alucina que seu corpo é o do outro sexo. Ele o reconhece de fato como é, mas nega isso e recorre à realização de intervenções cirúrgicas, para adequar sua anatomia à sua identidade sexual", diz Cossi.


O semblante, terceiro conceito que o autor sustenta, diz respeito à noção de aparência. "O transexual faz o semblante de que existem personalidades masculina e feminina claramente definidas e incorpora rigidamente uma delas. Por meio dessa atitude, quer se mostrar como uma mulher legítima presa em um corpo de um homem ou vice-versa. A encarnação deste estereótipo é condição fundamental para que o transexual possa ser reconhecido como tal e lhe seja permitido realizar a cirurgia de mudança de sexo", aponta o pesquisador.


Por fim, o conceito de nome sinthoma é útil porque reconfigura, a partir dos anos 1970, a clínica psicanalítica lacaniana, esvaziando seu caráter patologizante. O psicólogo diz que os casos de transexualismo não devem ser encaixados automaticamente em padrões que, inevitavelmente, condenam os sujeitos que não se enquadram no modelo heterossexual ao campo da patologia.


CIRURGIA PLÁSTICA


Segundo Cosi, tratar o transexualismo como uma singularidade de cada pessoa é entender a personalidade de cada uma delas e fugir dos estereótipos.


"Transexual não é apenas a pessoa que solicita a cirurgia de mudança de sexo. Há homens que vivem como mulheres e mulheres que vivem como homens mesmo com o órgão sexual oposto. Eles lidam bem com isso e sentem que não precisam fazer a cirurgia. Para muitos deles, sua redesignação civil, a mudança de nome, já lhes é suficiente, assim como o reconhecimento e o respeito do outro."
Definido o tema do IX ENUDS ( Salvador) será:



"RAÇA E RELIGIOSIDADES: ABRANGENDO AS FRONTEIRAS DA DIVERSIDADE SEXUAL!"